“Não podes fazer tuas, todas, as dores alheias, e sobretudo não podes desresponsabilizar sempre os outros”
Tinha sido isto que lhe dissera a sua filha mais velha quando a tinha visto com lágrimas nos olhos, por causa da coroa de flores que estava depositada a meia dúzia de metros da porta da sua casa.
No inicio dessa semana tinha havido na sua rua, habitualmente pacata, uma perseguição policial a uns alegados traficantes de droga.
A Eva estava no seu quarto quando ouviu o que lhe pareceu o barulho de tiros e de choques de carros. Já era habitual, no tempo de chuva, na rotunda frente ao seu prédio, alguns carros despistarem-se e irem bater nos que estavam estacionados.
Correu para a sala abriu a janela e deparou-se com uma cena de filme, uma série de carros de pantanas, um grande aparato policial um carro virado em sentido contrário, carros civis a pararem e deles a saírem, homens à civil, a sacarem de armas.
O marido e uma das suas filhas saíram para a rua, mas a Eva limitou-se a ficar a observar da janela.
A filha veio dizer-lhe que era, ou tinha sido uma perseguição policial, que os alegados traficantes estavam algemados a sangrar, deitados no chão e que a polícia já dominava a situação e que afinal os civis armados eram afinal polícias.
Entretanto chegaram três ambulâncias e a preocupação da Eva era porque é que os jovens continuavam no chão, algemados, a sangrar.
A Eva não tinha estômago para ver cenas daquelas sem dizer nada, por isso fechou a janela.
Quando o marido voltou disse-lhe que os jovens já tinham sido levados do local.
No outro dia alguém comentou que o mais novo (18 anos) estava em prisão domiciliária e que o outro de 25 anos estava em prisão preventiva.
No chão onde o mais novo tinha estado algemado as marcas de sangue continuavam visíveis.
A Eva ficou em estado de choque quando reparou que nesse local, passados dois dias, estava uma coroa de flores.
Afinal o mais novo dos alegados traficantes tinha morrido.
Os comentários, nos locais públicos, eram de todo o tipo. Que não se tinha perdido nada, que a coroa era para provocar a polícia etc., etc.
A Eva não conhecia os pormenores do que tinha acontecido mas não podia deixar de pensar que algures, uma mãe chorava por um filho adolescente que tinha morrido antes de tempo, e que nenhum mãe ou pai, por muito bem que eduque os filhos está livre de desgostos.
A coroa entretanto foi retirada mas a Eva continua a pensar, cada vez que passa pelo local, que na sua rua, muito perto da sua casa, um jovem morreu antes de tempo.
1 comentário:
Sempre tu Ana a escrever histórias...Parabéns!
Beijinho;Feliz Natal
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