sábado, 28 de maio de 2011

HISTÓRIAS DE VIDA…..Da náusea ao vómito….



Náuseas, era o que sentia cada vez que ouvia alguém justificar a crise como sendo devida à falta de produtividade dos portugueses.

Apetecia-lhe falar mal, soltar um palavrão à moda do Norte.

Mas não valia a pena, porque “não há mais cego do que aquele que não quer ver”.

Se compararmos com os nossos “amigos europeus” ganhamos mal, não trabalhamos menos, antes pelo contrário.

Deu consigo a pensar porque é que ninguém punha o dedo na ferida.

Porque é que ninguém dizia que um dos nossos principais problemas era a economia dita paralela, ou mais pomposamente chamada de informal.

Mas, não, ninguém tinha coragem para falar disso e para activar meia dúzia de medidas para acabar com o flagelo.

Também lhe custava pagar tantos impostos mas se todos pagassem as taxas, sobretudo as de IRS, baixariam de certeza.

Ao longo da sua vida profissional, por esses país fora, tinha visto tanta coisa e sempre, embora, não fosse da sua competência, pois não era fiscal das Finanças, sugeria que houvesse transparência nas contas das empresas.

Diziam-lhe que era uma cadeia, que se não facturavam tudo era porque quando compravam também era assim !!!!!

Nas últimas semanas deu consigo a “controlar” as pequenas lojas de bairro.

- No café pagava e ficava a aguardar que lhe dessem o talão de caixa,a maioria das vezes não davam. às vezes a desculpa era que o rolo de papel tinha acabado, mas outras vezes enganavam-se, inclusive, a registar o valor.

Numa dessas vezes tinha-se voltado para o dono do café e tinha dito:

- “Oiça senhor F…eu não sou fiscal das Finanças mas não acha que está a arriscar muito paguei 2,25 euros e registou apenas 50 cêntimos.

A resposta que obtinha era um sorriso amarelo.

- No lugar, à tarde, diziam-lhe:

- “Não precisa do talão pois não? é que acabei de fechar a caixa”.

- “Às seis da tarde? Pensava para consigo! !!!!

Deu consigo a pagar por Multibanco, quase tudo, com a esperança de que pelo menos esses valores fossem declarados.

Em nenhum dos debates a que tinha assistido ninguém, mas mesmo ninguém, tinha tocado no assunto.

Tinha ouvido a alguém ligado “ao meio” que se aguardavam politicas a nível europeu. Que era um área muito sensível. etc. , etc.…. etc

Estava farta de incompetências, e o que mais lhe doía é que sentia que éramos todos cúmplices, na sua maioria passivos, pois estes comportamentos já estavam enraizados na sociedade portuguesa.

Não aguentou e o argumento da redução da Taxa Social e dos dias de feriado para reduzir o custo da mão de obra, já de si tão pouco significativo, nos custos de produção, segundo eles como medida para ultrapassar a crise da economia portuguesa, fê-la passar da náusea ao vómito.

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UM abraço e bom fim de semana.
Ana
~PS (em latim leia-se) Não sei o que se passou mas durante a semana não consegui entrar no Bloge

sábado, 21 de maio de 2011

HISTÓRIAS DE VIDA – Faz hoje….. fez hoje cinquenta anos e três meses.


Nos últimos dias a sua Rua andava muito movimentada. Os trabalhadores da Junta de Freguesia andavam numa azáfama.

Ele era cortar a relva ele era plantar novas flores, nos canteiros.

Logo pela manhã, daquele sábado, o clima de festa estava instalado na sua Rua.

Para além da Polícia, viam-se os jovens músicos de uma banda a tentarem “arrumar-se” nos lugares de estacionamento entretanto desocupados para o efeito.

Porquê?

Porque fez hoje cinquenta anos e três meses que começou a Guerra do Ultramar e a autarquia de Sintra homenageou os ex- combatentes, mais propriamente os deficientes das forças armadas, atribuindo o seu nome a uma rotunda.

A emoção sentia-se no ar.

Da janela da sua casa assistiu à cerimónia e não pôde deixar de se comover, conjuntamente com todos aqueles que estavam ali presentes e que viveram a Guerra do Ultramar.

Era tão pequena quando a guerra começou e lembrava-se perfeitamente do ambiente que se viveu, do desgosto das mães portuguesas, do medo dos jovens de nunca mais voltarem.

Lembrou-se das “velhas” cerimónias do 10 de Junho com as viúvas e os órgãos a receberem medalhas. !!!!!!

Lembrou-se da imagem das mães e das namoradas vestidas de negro, vizinhas da sua rua.

Alegrou-se e emocionou-se, com os sorrisos daqueles homens, muitos em cadeiras de rodas que estavam ali a ser homenageados, a ponto de as lágrimas lhe correrem pela cara.

Foi bom ouvir que a História, mesmo a má, aquela que hoje nos “envergonha” deve ser lembrada às novas gerações para que dêem valor à Liberdade.

Que bom foi ouvir aquela banda composta só por jovens a tocar tão bem.

Que belo começo de fim de semana, depois da desgraça que tinha sido o serão da noite anterior passado a ver o debate entre a esquerda e a direita e a ouvir os comentadores, que nem abutres,com muita pressa, a votarem num vencedor quando o que está em causa, para além da crise financeira, é a derrota de todo um ideal de sociedade, de todo um País, pensou para com os seus botões .

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sexta-feira, 20 de maio de 2011

"Os meus Poetas ......."

Cântico Negro

"Vem por aqui" - dizem-me alguns com os olhos doces
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui!"
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...

A minha glória é esta:
Criar desumanidade!
Não acompanhar ninguém.
- Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre à minha mãe

Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...

Se ao que busco saber nenhum de vós responde
Por que me repetis: "vem por aqui!"?

Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí...

Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.

Como, pois sereis vós
Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...

Ide! Tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátria, tendes tectos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios...
Eu tenho a minha Loucura!
Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...

Deus e o Diabo é que guiam, mais ninguém.
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.

Ah, que ninguém me dê piedosas intenções!
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou.
É uma onda que se alevantou.
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
- Sei que não vou por aí!

José Régio - Poemas de Deus e do Diabo

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Um abraço
Ana

segunda-feira, 16 de maio de 2011

"os meus Poetas......VOZ"



Era uma voz que doía,

Mas ensinava.

Descobria,

Mal o seu timbre se ouvia

No silêncio que escutava.


Paraísos, não havia.

Purgatórios, não mostrava.

Limbos, sim, é que dizia

Que os sentia,

Pesados de cobardia,

Lá na terra onde morava.


E morava neste mundo

Aquela voz.

Morava mesmo no fundo

Dum poço dentro de nós.


“Miguel Torga – Poesia Completa
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Tenham uma boa semana.

Um abraço
Ana

domingo, 15 de maio de 2011

"Os meus Poetas..... PROMISSÃO"



O futuro é o meu reino, e eu caminho!

Lágrimas? Tantas, só de ser artista,

Que, se as relembro, turva-se-me a vista

E não vejo a miragem que adivinho.


Mas nem choro as angústias do passado,

Nem pranteio as presentes;

Vou com os olhos contentes,

Feliz de não chorar por ter chorado


“Miguel Torga – Poesia Completa”

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terça-feira, 10 de maio de 2011

Histórias de Vida …..Irresponsáveis! Quem eu?



Nos últimos dias tinha-se sentido desalentada, melhor ofendida e, sobretudo, humilhada.

Os comentários que se ouviam acerca da crise em Portugal e dos Portugueses faziam-na sentir assim.

Tinha começado a trabalhar aos 16 anos, após a conclusão do Curso Geral de Comércio, o que já era muito para a época, e prosseguiu os estudos a nível superior, sempre, à sua custa.

Aos 17 anos, mudou-se para uma grande empresa onde fez toda aprendizagem de uma vida. Tanto no aspecto cívico como profissional, trabalhou lá mais de 30 anos.

Em 2003 viu-se confrontada com o desemprego, pois a “sua”grande empresa tinha-se, entretanto, incorporado numa multinacional que ia ser deslocalizada, e deitou mãos à luta. Esteve poucos meses no Desemprego, para o qual tinha descontado uma vida inteira, e criou o seu posto de trabalho.

No inicio de 2008 voltou a sentir o desemprego, porque o Programa onde trabalhava como Consultora na área da Gestão, praticamente a tempo inteiro, foi abruptamente interrompido.

Voltou novamente à luta e deu consigo a ter de pagar comissões para ter trabalho como Consultora !!!!

Para se livrar disso, em 2010, tinha voltado a trabalhar com trabalhadora dependente, com um vencimento, práticamente, igual a metade do que ganhava na Multinacional.

Neste entretanto tinha sido obrigada a gastar as economias de uma vida para custear a educação das suas filhas e as doenças de familiares.

Já não sabia há quantos anos que não fazia férias fora de casa.

Tinha viajado, sim, alguns, muitos, milhares de quilómetros, mas sempre para trabalhar longe de casa e da sua família.

Fazendo o balanço da sua vida nunca tinha vivido acima das suas posses antes pelo contrário.

Finalmente, naquele dia, ao ver o Vídeo que a “Câmara de Cascais”? tinha elaborado para dar resposta aos Finlandeses, sentido que alguém, para além dela, neste País se sentia também humilhado e ofendido.

Deu consigo a pensar que não valia a pena votar nestas eleições porque nada iria mudar, mas à noite, respondeu a uma das suas filhas que mesmo votando em branco todos tínhamos de ir votar.

Claro que não ia votar em branco, apesar de tudo, valia a pena votar nos ideais de toda uma vida, mesmo sentindo que cada vez estavam mais longe de ser alcançados………

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segunda-feira, 9 de maio de 2011

"Os meus Poetas........"

Porque, e citando Miguel Torga:

“ – As coisas boas esquecem. As más é que não. É que só elas deixam cicatrizes”

Aqui fica:

Lembrança
Ponho um ramo de flores
na lembrança perfeita dos teus braços;
cheiro depois as flores
e converso contigo
sobre a nuvem que pesa no teu rosto;
dizes sinceramente
que é um desgosto.

Depois,
não sei porquê nem porque não,
essa recordação desfaz-se em fumo;
muito ao de leve foge a tua mão,
e a melodia já mudou de rumo.

Coisa esquisita é esta da lembrança!
Na maior noite,
na maior solidão,
vem a tua presença verdadeira,
e eu vejo no teu rosto o teu desgosto,
e um ramo de flores, que não existe, cheira.

Lisboa, Cadeia do Aljube, 6 de Dezembro de 1939

“Miguel Torga - Diário”

domingo, 1 de maio de 2011

"Os meus Poetas .........."


QUIETUDE


Que poema de paz agora me apetece!

Sereno,

Transparente,

A sugerir somente

Um rio já cansado de correr,

Um doce entardecer,

Um fim de sementeira.

Versos como cordeiros a pastar,

Sem o meu nome, em baixo, a recordar

Os outros que cantei a vida inteira.

Miguel Torga – Diário

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Passeio BTT Aboboreiras