sexta-feira, 24 de junho de 2011

Histórias de Vida …… Lembranças… Será que nada mudou? Será?


A lembrança não lhe saía da cabeça. Cada vez que se falava no “Estado Social” e nos custos com o Sistema de Saúde a lembrança voltava.

Não devia ter, ainda, seis anos e tinha ido com sua mãe a mais uma consulta da especialidade de Otorrino no Hospital de S. José.

Não se lembrava da consulta, nem sequer se era médico ou médica quem a tinha consultado. Lembrava-se, sim, de ter ouvido dizer que tinha de ser operada à garganta porque passava a vida doente, com problemas do aparelho respiratório.

No final da consulta tinha ido com a sua mãe à secretaria e tinha retido que era preciso tratar de um documento, qualquer, na Junta de Freguesia para poder ser operada.

No caminho perguntou à sua mãe o que é que tinham de ir tratar e ela tinha-lhe respondido que era um documento para não terem de pagar, a operação, no hospital.

À noite ouviu-a dizer ao seu pai que tinha de ir pedir um “ATESTADO DE POBREZA” para ela poder ser operada.

Hoje, ao recordar-se, disso, não sabia se esse “Documento” tinha sido obtido ou não mas sabia que a operação não se tinha concretizado.

Viviam do trabalho do seu pai, motorista de profissão, e certamente não teriam dinheiro para custear a operação.

Só foi operada já era uma jovem adulta, depois do 25 de Abril !!!!

Agora passados quase cinquenta anos tinha-se lembrado disso……

Será que é a esse estado de coisas que querem voltar quando pretendem acabar com o Sistema Nacional de Saúde ??? Será que nada mudou? Será?

____________________________________________________________________

quinta-feira, 23 de junho de 2011

Os meus Poetas ... Os erros"


Os Erros


A confusão a fraude os erros cometidos

A transparência perdida — o grito

Que não conseguiu atravessar o opaco

O limiar e o linear perdidos



Deverá tudo passar a ser passado

Como projecto falhado e abandonado

Como papel que se atira ao cesto

Como abismo fracasso não esperança

Ou poderemos enfrentar e superar

Recomeçar a partir da página em branco

Como escrita de poema obstinado?


"Sophia de Mello Breyner - "O Nome das Coisas"
_____________________________________________________

domingo, 19 de junho de 2011

os meus Poetas....Com fúria e Raiva"



Com Fúria e Raiva



Com fúria e raiva acuso o demagogo

E o seu capitalismo das palavras



Pois é preciso saber que a palavra é sagrada

Que de longe muito longe um povo a trouxe

E nela pôs sua alma confiada



De longe muito longe desde o início

O homem soube de si pela palavra

E nomeou a pedra a flor a água

E tudo emergiu porque ele disse



Com fúria e raiva acuso o demagogo

Que se promove à sombra da palavra

E da palavra faz poder e jogo

E transforma as palavras em moeda

Como se fez com o trigo e com a terra


"Sophia de Mello Breyner Andresen -"O Nome das Coisas"

___________________________________________________________

domingo, 12 de junho de 2011

Os meus Poetas .... Não Passarão



Não Passarão

Não desesperes, Mãe!

O último triunfo é interdito

Aos heróis que o não são.

Lembra-te do teu grito:

Não passarão!



Não passarão!

Só mesmo se parasse o coração

Que te bate no peito.

Só mesmo se pudesse haver sentido

Entre o sangue vertido

E o sonho desfeito.


Só mesmo se a raiz bebesse em lodo

De traição e de crime.

Só mesmo se não fosse o mundo todo

Que na tua tragédia se redime.


Não passarão!

Arde a seara, mas dum simples grão

Nasce o trigal de novo.

Morrem filhos e filhas da nação,

Não morre um povo!


Não passarão!

Seja qual for a fúria da agressão,

As forças que te querem jugular

Não poderão passar

Sobre a dor infinita desse não

Que a terra inteira ouviu

E repetiu:

Não passarão!



“Miguel Torga – Antologia Poética”

______________________________________________________

quarta-feira, 8 de junho de 2011

"Os meus Poetas..." - PANORAMA

PANORAMA

Pátria vista da fraga onde nasci.

Que infinito silêncio circular!

De cada ponto cardeal assoma

A mesma expressão muda.


É de agora ou de sempre esta paisagem

Sem palavras,

Sem gritos,

Sem o eco sequer duma praga incontida?

Ah! Portugal calado!

Ah! Povo amordaçado

Por não sei que mordaça consentida!


"Miguel Torga - Antologia"

____________________________________________

domingo, 5 de junho de 2011

"Os meus Poetas.... LAMENTO"


LAMENTO



Pátria sem rumo, minha voz parada

Diante do futuro!

Em que rosa-dos-ventos há um caminho

Português?

Um brumoso caminho

De inédita aventura,

Que o poeta, adivinho,

Veja com nitidez

Da gávea da loucura?



Ah, Camões, que não sou, afortunado!

Também desiludido,

Mas ainda lembrado da epopeia….

Ah, meu povo traído,

Mansa colmeia

A que ninguém colhe o mel!.....

Ah, meu pobre corcel

Impaciente,

Alado

E condenado

A choutar nesta praia do Ocidente…


“Miguel Torga – Poesia Completa”

________________________________________________

"Os meus Poetas.....Pátria"

PÁTRIA

Soube a definição na minha infância.

Mas o tempo apagou

As linhas que no mapa da memória

A mestra palmatória

Desenhou.


Hoje

Sei apenas gostar

Duma nesga de terra

Debruada de mar.


"Miguel Torga – Antologia Poética"

_______________________________________________________


Um abraço.
Ana

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Os meus Poetas...... ESPERANÇA

ESPERANÇA

Quero que sejas

A última palavra

Da minha boca.

A mortalha de sol

Que me cubra e resuma.

Mas como à despedida só há bruma

No entendimento

E o próprio alento

Atraiçoa a vontade,

Grito agora o teu nome aos quatro ventos.

Juro-te enquanto posso, lealdade

Por toda a vida e em todos os momentos

"Miguel Torga - Diário Volumes IX a XII
______________________________________________________________________

Passeio BTT Aboboreiras