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domingo, 30 de outubro de 2011
Os meus Poetas - "Semear a Esperança"
“- Lavro aqui mais uma vez o meu protesto contra toda esta filosofia do pessimismo que nos sufoca, e esta literatura do absurdo que nos liquida. Nenhum argumento nem nenhum sortilégio podem apagar no espírito do homem a luz de ilusão que ali bruxuleia. O erro grosseiro dos ironistas e dos derrotistas é não verem que eles próprios desmentem o visco e as profecias, porque, se lutam, é porque confiam. Sobretudo parece-me uma limitação querer fotografar para a eternidade a face monstruosa de um momento. A Europa pode estar cansada, falida, contaminada por vícios incuráveis, mas a Europa não é o mundo, e ela própria tem ainda pedaços do corpo sem gangrena. Quando todos os analfabetos e famintos que lhe restam tiverem voz e pão, e falem de náusea, quando a herança da história, os bens do espírito forem repartidos igualmente por todos os seus filhos, e o clamor colectivo seja de teimosa renúncia, então sim, soou a hora. Mas antes disso, não!
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Há ainda uma poda que é necessário fazer: eliminar da actual angústia que nos atormenta o cinismo que a macula e o parasitismo que a explora. A verdadeira razão e o verdadeiro instinto mandam curar as feridas. Só os mendigos deitam sal nas chagas para as avivar.
Alienação humana! Quem é que autorizou meia dúzia de intelectuais impotentes a falar deste modo em nome da humanidade? A chapinhar na lama deles, e a proclamar que é na lama dos outros? Que o testemunho da nossa aventura na terra é um rosário de traições e injustiças, ninguém o nega; que é preciso que se diga isso de todas as maneiras, é evidente; mas nem tudo o que fizemos foi mau, e estamos a começar ainda.
Não! Há-de haver uma salvação possível neste mar de naufrágios, e vão sendo horas de erguer a voz contra os derrotistas da jangada. Aterrados pelas suas fúnebres ladainhas, temo-nos esquecido de reparar nos acenos do horizonte, onde amanhece sempre uma ilha à nossa espera. Não a ilha solitária de Robinson, que seria o recomeçar inútil duma vida de egoísmo e de esterilidade, mas o húmus generoso dum novo mundo onde se possa semear a esperança.”
Miguel Torga – Diário Volumes V a VIII (08/02/1951)
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Um abraço do tamanho do mundo.
Ana
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