Pagina oficial de Um Grupo Excepcional de Aprendentes e Formadores que têm em comum a AMIZADE e a SOLIDARIEDADE
sábado, 27 de novembro de 2010
"Os meus poetas"...... Liberdade
- Liberdade, que estais no céu...
Rezava o padre-nosso que sabia,
A pedir-te humildemente,
O pão de cada dia.
Mas a tua bondade omnipotente
Nem me ouvia.
- Liberdade, que estais na terra...
E a minha voz crescia
De emoção.
Mas um silêncio triste sepultava
A fé que ressumava
Da oração.
Até que um dia, corajosamente,
Olhei noutro sentido, e pude, deslumbrado,
Saborear, enfim,
O pão da minha fome.
- Liberdade, que estais em mim,
Santificado seja o vosso nome
" MIguel Torga - Poesia Completa"
quarta-feira, 24 de novembro de 2010
ESTA GENTE
Às vezes luminoso
E outras vezes tosco
Ora me lembra escravos
Ora me lembra reis
Faz renascer meu gosto
De luta e de combate
Contra o abutre e a cobra
O porco e o milhafre
Pois a gente que tem
O rosto desenhado
Por paciência e fome
É a gente em quem
Um país ocupado
Escreve o seu nome
E em frente desta gente
Ignorada e pisada
Como a pedra do chão
E mais do que a pedra
Humilhada e calcada
Meu canto se renova
E recomeço a busca
De um país liberto
De uma vida limpa
E de um tempo justo
Sophia de Mello Breyner Andresen
terça-feira, 23 de novembro de 2010
Pensamentos do dia
O que eu queria dizer era:
Janeiro de 1974
Abraços
Ana
segunda-feira, 22 de novembro de 2010
Pensamento do dia
Tenho tentado fazer disso um lema, mas está a tornar-se dificil.
Em Janeiro de 2004, em pleno regime facista a empresa onde eu trabalhava, fez greve durante três dias.O espirito de luta e de coesão era tal que a "parada" estava cheia de operários de administrativos, enfim, com todos os trabalhadores.
Hoje, em pelo regime "democratico", em vesperas de se fazer uma greve geral o meu entusiasmo é praticamente nulo.
Perguntarão porquê?
E eu respondo com perguntas:
- Quantos jovens irão fazer greve? Quantos trabalhadores?
- Será que não vão ser só os trabalhadores de cinquenta e tal anos que vão ter coragem ?
Vem isto a propósito de alguns comentários que ouvi hoje e que se resumem num deles:
" A Malta tem medo"!!!!!!!
Um abraço
Ana
Pensamento do Dia
Quantos de nós por vezes não nos levantamos com um pensamento que nos acompanha ao longo do dia.
Hoje deixo um pensamento que nos deve permitir pensar e talvez sorrir...
Abraços e beijos dentro das necessidades,
Jaime Matos
domingo, 21 de novembro de 2010
MISSÃO
Havia sentinelas a guardar
A fronteira do sonho proibido.
Mas ergui, atrevido,
A voz de sonhador,
E passei
Como um rei,
Sem dar mostras do íntimo terror.
E cá vou, a passar,
Aterrado e sozinho,
A lembrar
O santo-e-senha com que abri caminho....
"Miguel Torga - Diário"
- Para o Jaime e para o Luis e para todos aqueles que embora lidando com a morte todos os dias, continuam a acreditar na vida...
Um abraço do tamnho do mundo
Ana
Mais uma vez estou a trabalhar, fechado junto dos doentes.
Lá fora frio , muito e alguma chuva, pouca.
As visitas estão para entrar, e já estou a imaginar os pais de uma senhora de 40 anos que está an lutar com vida, a chorarem e a pensar que depois de tanto sofrimento, estarão na eminência de ver partir a filha.
No outro dia em desabafo dizia entre os lábios com as lágrimas a correr "..não sei se terei forças para cuidar dos meus netos...".
Fiquei pensativo, porque também tenho filhos e gostaria de ter netos (ainda longe...), pois a vida realmente resume-se a nada. Há que vivê-la no dia-a-dia, com humildade e com a noção que poderá não haver o amanhã.
Tento sempre estar "up", e no outro dia a ler algo, vi este poema que realmente ilustra este sentimento que sinto quando olho para oa pais da doente.
Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.(…)
Conquistámos todo o mundo antes de nos levantar da cama;
Mas acordámos e ele é opaco,
Levantámo-nos e ele é alheio,
Saímos de casa e ele é a terra inteira,
Mais o sistema solar e a Via Láctea e o Indefinido.(…)
Come chocolates, pequena; Come chocolates! Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
Fernando Pessoa
Abraços e beijos dentro das necessidades,
Jaime Matos
SILVO
Ouvi o apelo, e sigo nestes versos
Ao vosso encontro.
A noite é um largo leito de renúncias
Adormecidas,
Mas nós não temos sono
E abrasa-nos a fé na madrugada.
Vamos! Vamos, fraternos,
Paralelos nos trilhos do destino,
Dizer bom dia ao sol, o deus menino,
Eternamente loiro e renascido
No presépio dos mundos apagados.
Saudar a esperança é o prémio concedido
Aos acordados!
"Miguel Torga - Diario"
sexta-feira, 19 de novembro de 2010
REPENSAR AS LUTAS
quinta-feira, 18 de novembro de 2010
Um destes dias ouvi um dirigente sindical afirmar em público que tínhamos que acabar com o amorfismo em que os portugueses estão.
Há muito tempo que não ouvia empregar este termo e tive dúvidas se o estava a entender bem. Pensando melhor penso que o que quereria dizer é que os Portugueses precisam de reagir de partir para a luta de não se acomodarem….
Não sei se os Portugueses estão a sofrer de amorfia mas tenho a certeza que a uma boa parte deles o que os impede de falar é o MEDO, MEDO de perderem o emprego, MEDO de serem agredidos. MEDO !!!!! MEDO !!!!! De tudo.
Vem isto a propósito de uma cena a que assisti nos Armazéns do Chiado na cafetaria dum espaço que vende livros, música….
Estava eu sentada a uma mesa, a comer, quando vejo uma jovem com uma chávena de chá numa mão e um prato com um bolo na outra dirigir-se para uma mesa que estava vazia. Volto a olhar e vejo-a a voltar para trás a abanar a cabeça, com um ar indignado.
Moral da história, estava um grupo na fila para pagar os cafés e um dos membros saiu da fila para ir “marcar” a mesa e a jovem que estava à frente ficou sem lugar.
Ofereci-lhe lugar na minha mesa, que aceitou, e fiquei com vontade de a questionar porque é que não tinha dito nada, mas não o fiz. Certamente o que a travou a ela foi o medo de uma discussão em público. O que me travou a mim foi o pudor, não a quis incomodar mais do que já estava.
Será que já não vale a pena reagir? Que já estamos tão esgotados? Que já nos consideramos derrotados?
Quem responde ????
segunda-feira, 15 de novembro de 2010
Sementeira
Foi a mão como um ralo a semear
Que me disse que sim, que acreditasse;
Que a vida era um poema a germinar,
E portanto cantasse
Miguel Torga -Poesia Completa I
domingo, 14 de novembro de 2010
Esta Gente / Essa gente
O que é preciso é gente
gente com dente
gente que tenha dente
que mostre o dente
Gente que não seja decente
nem docente
nem docemente
nem delicodocemente
Gente com mente
com sã mente
que sinta que não mente
que sinta o dente são e a mente
Gente que enterre o dente
que fira de unha e dente
e mostre o dente potente
ao prepotente
O que é preciso é gente
que atire fora com essa gente
Essa gente dominada por essa gente
não sente como a gente
não quer
ser dominada por gente
NENHUMA!
A gente
só é dominada por essa gente
quando não sabe que é gente
Ana Hatherly, "Um Calculador de Improbabilidades"
Uma boa semana e .... um abraço do tamanho do mundo
Ana
MORREU O HOMEM DO MOUCHÃO
Na Noite...
Aqui estou eu no meu trabalho a fazer mais uma noite....
Aqui dentro o ambiente é pesado. Uma pessoa nova, mal e outros um pouco mais velhos acabados, mas quente.
A vida é isto mesmo, um crescendo, queremos que sempre bem, mas às vezes, nem por isso.
Lá fora frio, chuva e vento.
Parece que chegou o Inverno.
Penso naqueles que por infortúnio da vida ou por outros azares estarão ao relento, sem a possibilidade se se aquecerem física, social ou até mentalmente.
Já nem direi que mais uma vez será NAtal, esse tempo que, blá, blá, blá, blá.
Tenho pena que apessar de todas as dificuldades emergentes na sociedade, continuamos a pensar só em nós, no nosso bem estar e pouco preocupados com os outros.
Que apesar de tudo começemos a ser mais solidários e abrangentes com os outros.
Boa preparação para o Natal.
Mas antes, que a solidariedade apareça a 24 mas de Novembro. Que caminhemos todos por mais justiça, igualdade e solidariedade.
Um abraço ou beijinho, dentro das necessidades.
Jaime Matos
sábado, 13 de novembro de 2010
Histórias de Vida - Medo, racismo ou precaução
Parou, olhou em volta e escolheu o local onde se queria sentar, sem antes pensar com os seus botões que estava a ficar medricas.
Na semana anterior tinha perdido por pouco o comboio das 20,00 horas e teve de esperar pelo seguinte.
Quando entrou na carruagem esta estava vazia e sentou-se no primeiro lugar que lhe apareceu. Quando o comboio estava quase a partir entraram três mulheres, negras, que se sentaram nos lugares ao pé da Eva.
A que se sentou ao seu lado, quando o fez, deu-lhe uma cotovelada e, nem se dignou pedir-lhe desculpa.
A que se sentou à sua frente ferrou-se a dormir e ninguém a ouviu durante toda a viagem.
O problema foi o comportamento das outras duas. Iam entretidas a comer castanhas, cruas, a cuspirem as cascas e a Eva continuou a levar cotoveladas durante a viagem.
Cada vez que levava uma cotovelada a Eva olhava para a sua companheira de viagem que nunca se deu ao trabalho de lhe pedir desculpa nem de cuidar se quando cuspia as cascas a atingia.
A situação estava a ficar deveras desagradável para já não falar que conversavam animadamente, aos gritos, mas as em crioulo.
A Eva cada vez se encolhia mais no seu lugar até que a outra mulher que estava sentada ao lado da que dormia, disse meio em crioulo meio em português, para a outra ter cuidado que ainda partia a “branquela”.
Quando ouviu isto a Eva olhou em volta e reparou que 90% dos passageiros da carruagem eram de cor negra e pensou com os seus botões que o melhor era aguentar calada porque ninguém viria em seu socorro se o caldo entornasse.
Quando as duas mulheres saíram a Eva respirou de alívio sem deixar de reparar na sujeira que tinham deixado no chão e nos bancos do comboio.
Olhou para a que estava à sua frente e reparou que tinha um bonito penteado entrançado, olhou melhor e, reparou que no dito cabelo se passeava um bichinho.
- Será algum piolho?
- Mau, mau só me faltava agora apanhar piolhos para completar a viagem.
- “Não, não é racismo mas sim medo” - pensou a Eva com os seus botões - “A partir de determinada hora tenho de começar a ter mais cuidado onde me sento, porque isto hoje, podia ter dado para o torto.”
A Eva recordava tudo isto quando se sentou ao lado de uma mulher de cor, com bom aspecto.
- " Hoje a viagem vai correr melhor"- pensou ela.
- Estarei a ficar medrosa? interrogou-se
- Não, não é medo nem sequer racismo, é, apenas precaução. Concluiu a Eva após se ter sentado.
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Bom domingo
Um abraço
Ana
sexta-feira, 12 de novembro de 2010
"Antes tarde que nunca"

- Por onde andariam quase todos os bloguistas e restantes formandos?
- Porque foi adiado sine die, o almoço de convívio que tanto expectávamos?
- Será que as pessoas podiam ter mudado tanto?
Hoje e após alguns tempos de reflexão e após a mensagem do Virgílio, decidi voltar novamente, espero mais regularmente, para dizer nem que seja o que me vai na alma.
Para a Ana, coragem sem excepção, não posso de deixar o primeiro beijinho. admito que não sou muito virado para a poesia, nem para a prosa, mas gosto de ler todas as suas histórias e apontamentos. Não tenho muito jeito para escrever, mas gosto de ler e reflectir.
Para o Virgílio, grande Amigo, Homem eternamente grande, um abraço de saudade. Quando penso nesses tempos passados juntos com a maior harmonia e sinceridade, não posso de pensar numa grande pessoa e num amigo sempre coerente e sempre com uma pontinha de reflexão, obrigando-me a questionar .
Para o Egídio"Pai e Mãe" do blogue, grande companheiro de estadia, sempre com o lugar de estacionamento reservado "que saudades deve ter a EMEL de ver esse carrito sempre no mesmo sítio", com a enorme capacidade de conciliar e de espicaçar para motivar, grande impulsionador de um almoço "esquecido". um enorme abraço de amizade, Temos falado "pouco" por mail, mas já tenho saudades de falar pessoalmente.
O Luís, esse companheiro de viagens e do dia-a.-dia, não preciso de dizer nada, pois tenho a sorte de o ver todos os dias e de o abraçar.
Para os outros, o António, ainda me manda mails, mas para todos os outros, um grande beijinho e abraços de saudade.
Já disse que a vida dá voltas, mas uma volta tão grande que não tenham dito mais nada?
Sei que todos temos muito mais vida para além do blogue, mas sem os amigos, a vida não vale de nada. Na minha profissão, e porque vejo muita coisa, defendo e pratico que devemos viver a nossa vida no dia-a-dia, se possível rodeado daqueles que mais queremos .
Zé Rui já és Presidente? grande amigo.
Para terminar e tendo a noção que estive um pouco afastado só fisicamente, queria propor-vos um desafio.
Que tal marcar um almoçarito com comida tipicamente beirã, em Castelo Branco par o início de Janeiro? Pode ser que seja o recomeço de grandes momentos de grandes tertúlias.
Por agora beijos e abraços dentro das necessidades,
Sempre amigo, Jaime Afonso de Matos
quinta-feira, 11 de novembro de 2010
MAIS UM CRIME EUROPEU!
segunda-feira, 8 de novembro de 2010
Sabedoria do Mundo
Não fiques em terreno plano.
Não subas muito alto.
O mais belo olhar sobre o mundo
Está a meia encosta.
"Friedrich Nietzsche "
Formação - Saiu-me a Fava
CARTA ABERTA COM SENTIDO...
domingo, 7 de novembro de 2010
Esperança
Espremo o sol num poema, e bebo o sumo.
Pode muito esta humana fantasia!
Navegava a direito, no meu rumo,
Qundo nisto,
A monção
Desvia-me das velas a ilusão
E atola-me num mar de calmaria!
Mas resisto,
Embebedo-me assim na solidão,
E aguardo que renasça a ventania....
"Miguel Torga"
Será que vale a pena continuar?
Ontem, numa conversa sobre o nosso Blog, disseram-me que não fazia sentido, para eles, eu, continuar a escrever num Blog colectivo, em que só eu, praticamente, escrevo ,embora sublinhassem que gostavam do que eu escrevo, e sugeriram-me que criasse o meu próprio Blog.
Lembrei que o Blog tinha sido criado para substituir a Mesa da Poesia que tinha funcionado tão bem durante a nossa formação à distância, e que o nome do Blog se tinha inspirado em duas personagens fictícias que tínhamos criado no nosso bar virtual o Dagoberto e o Malaquias.
Que a ideia de se ter criado o blog, tinha sido minha e do Virgílio para manter os laços que se tinham criado durante a formação que tinha durado quase um ano,e para, sobretudo, mantermos o espírito da Mesa da Poesia.
Adiantaram , ainda, que achavam que o facto de no nosso Blog estar a imagem da sede da CGTP, e de haver links para o site da CGTP e do IBJC, poderia ser inibidor porque as pessoas não gostavam de se expor, melhor de correr riscos ou de serem conotadas com essas organizações. Argumentei que, como era do conhecimento geral, tínhamos frequentado o curso no IBJC, cujas instalações ficam situadas no mesmo edifício e que o facto de o criador do Blog ser dirigente sindical talvez tivesse influenciado esse facto, que a mim não me fazia impressão nenhuma mas se eles achavam isso que participassem no Blog e propusessem a retirada da imagem, que quanto ao risco, os Blogistas podem, se o desejarem, manter o anonimato.
Esclareci que o Blog, pelo menos para mim, não era nenhum espaço de militância política, eventualmente civica, mas uma forma, actual, de comunicarmos uns com os outros, os ex-formandos e os ex-formadores e que tínhamos um espaço mais reservado para debater, em privado, as questões relacionadas com a SST (Segurança e Saúde no Trabalho) mas que, infelizmente, também não estava a funcionar.
Lembraram-me que o Virgílio tem o seu próprio Blog em que escreve regularmente e outros membros do grupo também participam noutros blogs!!!! que se os participantes/membros, têm tempo para espreitar porque é que não dizem nem um olá, um viva, um tudo bem?
Em suma conseguiram criar-me a dúvida se vale a pena continuar a acreditar na existência de um grupo, cujo espírito de pertença, pelo menos, aparentemente já era.
Coloco-vos a questão:
- Será que o grupo ainda existe?
- Vale a pena continuar com o Blog?
Um abraço do tamanho do Mundo
Ana Fernandes
sábado, 6 de novembro de 2010
Histórias de Vida - Solidão!!!!
Quem se deliciava com isso eram os turistas, era vê-los de manga curta a passear pela Baixa com um ar de contentamento, a Eva olhou , em frente, e viu o Castelo de S. Jorge iluminado.
- “Que bonita que é Lisboa” – pensou mais uma vez.
Sem dar conta os seus passos levaram-na para a rua onde a Maria José, a sem abrigo costumava estar, olhou para o relógio da Praça D. Pedro IV e pensou que àquela hora já não era costume encontra-la.
Deu com a Maria José no sítio habitual, mas sentada no chão, com o ar mais triste deste mundo. Aproximou-se e entregou-lhe a moeda habitual e perguntou-lhe como estava.
-Triste. - Respondeu-lhe ela.
- Porquê?
- Ele (cãozinho) está doente.
Efectivamente o cãozinho estava a dormir ao seu colo, e nem quando a Maria José lhe levantou o focinhito, abriu os olhos.
A Eva perguntou-lhe se já o tinha levado ao veterinário e a Maria José mostrou-lhe os medicamentos.
Não quis entrar em pormenores, porque a Maria José dizia, sempre, que o assunto era o cãozinho, que tinha uma senhora sua amiga a quem recorria quando o cãozinho estava doente e de quem recebia sempre ajuda.
Perguntou-lhe se não seria do frio da rua se continuavam a ir dormir ao pé do Aeroporto, no anexo, que lhe tinham dispensado.
O olhar triste e cansado da Maria José desmentiu as suas palavras:
- Que sim que continuavam a ir para lá dormir.
A Eva queria acreditar nisso mas o certo é que a Maria José estava com um ar abatidíssimo, com ar de quem dormia na rua e não num anexo.
A sua, pouca, bagagem, arrumada atrás das suas costas demonstrava a sua condição de sem abrigo.
A Eva não se sentiu com coragem para insistir no assunto. Que direito é que ela tinha de fazer com que a Maria José se sentisse ainda pior.
Perguntou-lhe se continuava a desenhar e a Maria José respondeu-lhe que agora que vinha o Inverno se ia dedicar ao desenho e à pintura.
- Já tem os materiais?
- Não, mas hei-de arranjá-los.
A Eva despediu-se e recomendou-lhe que recorresse à ajuda da Santa Casa, a algum abrigo, enfim que se protegesse.
A Maria José agradeceu-lhe o cuidado e disse-lhe:
- Que Deus a proteja!
E quem é que a protegia a ela? Interrogou-se a Eva, quando se voltou para trás para olhar mais uma vez, a Maria José e o seu cãozinho, e reparou na volta que os transeuntes davam para evitarem aquela mulher, sentada no chão, e de mão estendida.
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quarta-feira, 3 de novembro de 2010
Esperança
Sei o teu nome, e chamo-te em silêncio.
Não quero despertar
O rancor assassino
Dos guardas vigilantes
Que te negam....
Vem, se puderes passar
Através do seu ódio secular,
A única tarimba onde sossegam.
Ah, que festa haveria nos meus braços,
Se batesses à porta, como outrora!
Toda a casa acredita nessa hora,
E ouve, em sobressalto,
Cada leve rumor que se aproxima...
Vem, se puderes passar.
Vem, se puderes mostrar
A eterna juventude que te anima.
"Miguel Torga"
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Um abraço
Ana
segunda-feira, 1 de novembro de 2010
Histórias de vida - Sentimento de culpa
Tinha-se levantado naquela manhã com a firme determinação de ir ao cemitério. Não era por se estar a aproximar o dia de finados, mas sim porque era uma rotina que já mantinha há oito anos. Tantos quantos havia desde que o seu pai falecera.
A manhã estava chuvosa, parecia um dia de inverno, mas a Eva não ia desistir dos seus propósitos.
Comprou as flores no vendedor habitual, à porta do cemitério, pediu o balde emprestado e dirigiu-se para o local da campa do seu pai.
O cemitério estava praticamente vazio. Tratou da campa do seu pai e não pôde deixar de se lembrar que o seu pai tinha sido sepultado duas vezes. A primeira aquando do seu falecimento e a segunda decorrido três anos após essa data, porque a gestão do cemitério não tinha atendido ao seu pedido, para aguardar mais algum tempo pois, ainda era cedo demais para proceder à exumação. A Eva gostava de não ter tido razão, mas tinha tido, e o seu pai voltou a ser sepultado no mesmo local.
De seguida dirigiu-se para o ossário da sua mãe, onde colocou as flores habituais sem esquecer a rosa que colocava sempre em nome dos netos.
Chovia torrencialmente e viam-se as pessoas do costume, todas idosas, não se via um jovem no cemitério.
A Eva pensou:
- “As pessoas evitam os cemitérios com medo dos mortos mas dos vivos é que devem ter medo.”
Iniciou o caminho de regresso, continuava a chover torrencialmente, e, não pôde deixar de sorrir. Um motar sénior, com o capacete ainda colocado e, com duas rosas na mão dirigia-se apressadamente para o local onde estas seriam colocadas.
De repente reparou numa senhora muito velhinha, parada, no meio da rua que dividia as campas, a falar sozinha.
Dirigiu-se a ela e perguntou-lhe se precisava de ajuda.
- Que não só não sabia bem onde ficava a campa.
- Veio sozinha?
-Vim com a minha filha, mas como ando devagar ela foi à frente.
- Vá devagarinho, ali à frente estão dois funcionários do cemitério e se não encontrar a sua filha peça-lhes ajuda – recomendou-lhe a Eva antes de se despedir.
Dirigiu-se para o carro e mais uma vez doeu-lhe a alma. Lembrou-se das palavras da sua amiga médica:
-“ Fizeste tudo o que era possível era impossível tê-los em casa.”
Seria! Mas o sentimento de culpa de os seus pais terem passados os últimos meses de vida internados, numa casa de saúde, nome pomposo para o lar e de não terem falecido em casa, não a havia de abandonar enquanto fosse viva.
Entrou no carro limpou a cara da muita chuva e das lágrimas da tamanha saudade que sentia dos pais.
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